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25 de Abril de 2024

Em relação aos bens particulares do autor da herança, a companheira terá direito ao mesmo quinhão dos descendentes

No caso analisado, Recurso Especial 1.617.501-RS (2016/0200912-6), a controvérsia girou em torno do quinhão que a companheira deveria receber, pois ela concorre com filhos comuns e exclusivos do autor da herança.

Publicado por Emmanuele Fronza
há 5 anos


O CASO


 No julgamento do Recurso Especial nº 1.617.501 – RS (2016/0200912-6), sob relatoria do Excelentíssimo Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, foi analisada a seguinte questão:

 O homem viveu em união estável com a sua companheira (de 1977 até a data do óbito), tendo com ela um filho. Além desse filho, o falecido tinha outros seis filhos exclusivos (de outro relacionamento). Esta é a chamada filiação híbrida (filhos comuns + filhos exclusivos de um dos cônjuges).

 Por se tratar de uma união estável, o regime aplicável é o da comunhão parcial de bens (art. 1.725, CC). Neste regime, o patrimônio constituído onerosamente durante a união estável é dividido em dois. A primeira metade é da companheira, a segunda metade é dividida entre todos os herdeiros. Os bens que cada um dos companheiros tinha antes de iniciar a união estável são chamados de bens particulares e são divididos entre os herdeiros.

 A controvérsia girou em torno da fixação do valor que a companheira deveria receber, pois o falecido deixou 7 filhos, 1 comum e 6 exclusivos, sendo que a legislação não contempla a situação da concorrência híbrida¹.


art. 1.790: A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes: (Vide Recurso Extraordinário nº 646.721) (Vide Recurso Extraordinário nº 878.694)

I – se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;

II – se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles;

[…]


 O art. 1.790 do Código Civil (CC), inciso I, disciplina que se os filhos forem comuns (do falecido e da viúva), a companheira terá direito ao quinhão (quantia) herdado por cada filho. Já o inciso II do mesmo dispositivo diz que, se houver somente filhos exclusivos (só do cônjuge falecido), a companheira herdará a metade do que for recebida por cada filho.

 E na hipótese de haver filhos comuns (do falecido e da viúva) e exclusivos (do autor da herança), como neste caso? Pois é, a legislação não contempla a questão específica da filiação híbrida.

 O Ministério Público (MP), que recorreu da decisao do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, sustentou que o instituto da união estável e do casamento deveriam ter tratamentos diferentes entre si. Inclusive, esta seria a melhor forma de atender aos interesses dos filhos, pois a companheira ficaria com uma parte maior, tendo em vista que a metade dos bens adquiridos onerosamente durante a união estável é pertencente a ela.

 Sendo assim, para o MP, deveria ser adotada a regra do art. 1.790, inciso II do Código Civil, ou seja, a companheira deveria receber a metade do valor recebido por cada por cada filho do autor da herança.



Inconstitucionalidade do art. 1.790, CC


 Ocorre que o art. 1.790 do CC foi incidentalmente declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (julgamento do RE nº 878.694), ocasião em que foi determinada a aplicação do art. 1.829 e seguintes do CC no regime sucessório da União Estável², ou seja, deve ser adotado o mesmo parâmetro legal do casamento.

 A interpretação do STJ acerca deste dispositivo é a de que o cônjuge sobrevivente irá concorrer com os descendentes somente quando o falecido tiver deixado bens particulares, como neste caso. Desta forma, a controvérsia do caso em questão está em como se deve ocorrer a divisão dos bens particulares do autor da herança, ou seja, aqueles bens que eram dele anteriormente à união estável.



Deverão estes bens serem divididos igualmente entre a viúva e os descendentes? Ou será que a viúva deverá receber a metade percebida por cada filho?


 Para o Ministro relator, Paulo de Tarso Sanseverino, a companheira tem direito a receber a mesma quantia paga a cada um dos descendentes do falecido (no que concerne aos bens particulares do autor da herança, e não sobre a totalidade da herança).

 Ainda, com relação a aplicação do art. 1.832 do CC, que disciplina a reserva de ¼ da herança para a companheira, esta não deve ser aplicada no presente caso.


Art. 1.832. Em concorrência com os descendentes (art. 1.829, inciso I) caberá ao cônjuge quinhão igual ao dos que sucederem por cabeça, não podendo a sua quota ser inferior à quarta parte da herança, se for ascendente dos herdeiros com que concorrer.


 Segundo o relator, a regra é clara quando existem apenas descendentes comuns ou apenas descendentes exclusivos, aplicando a reserva de ¼ quando o cônjuge sobrevivente concorrer apenas com filhos comuns. No entanto, o presente caso trata de concorrência híbrida, a qual não foi prevista pelo legislador.

 Sendo assim, o relator adotou a orientação adotada pela 5ª Jornada de Direito Civil do CJF, enunciado 527, que aduz: “Na concorrência entre o cônjuge e os herdeiros do de cujus, não será reservada a quarta parte da herança para o sobrevivente no caso de filiação híbrida.”


 Portanto, foi parcialmente reformado o acórdão recorrido, reconhecendo que a companheira concorrerá com os filhos (comuns e exclusivos) apenas sobre os bens particulares, e não sobre o montante total dos bens do falecido.


¹ denominação utilizada por Giselda Hironaka.

² Nas palavras do iminente Ministro Luís Roberto Barroso: “(…) dou provimento ao recurso para reconhecer de forma incidental a inconstitucionalidade do art. 1.790 do CC/2002, por violar a igualdade entre as famílias, consagrada no art. 226 da CF/1988, bem como os princípios da dignidade da pessoa humana, da vedação ao retrocesso e da proteção deficiente. Como resultado, declaro o direito da recorrente a participar da herança de seu companheiro em conformidade com o regime jurídico estabelecido no art. 1.829 do Código Civil de 2002.”


http://conectadireito.com.br/


Informações: STJ

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